EVA ESPERANÇA GUTERRES ALVES – Professora de História CMPA
Compor a memória coletiva da prática escolar Tertúlia
Romântica, projeto interdisciplinar desenvolvido por dez anos com os alunos da
segunda série do Ensino Médio do Colégio Militar de Porto Alegre, apresenta-se
para a professora envolvida na atividade não como mera referência ilustrativa
na sua atuação como profissional, mas sim como uma reflexão quanto ao
compromisso da atuação docente.
As representações e apresentações desde o primeiro sarau em
1999 ao ano de 2008, quando, nos 100 anos da morte de Machado de Assis, a obra
literária do “bruxo do Cosme Velho” foi o foco temático, foram manifestações do
conhecimento produzido pela autoria de alunos que vivenciaram, embora em uma
escola tradicional, uma prática interdisciplinar alternativa como sujeitos do
processo ensino-aprendizagem.
Lembro que Clio uniu-se à Calíope, a musa da poesia épica, outra
das filhas de Mnémosine, justamente aquela que inspirou Camões, de acordo com o
que está no início do Canto III de Os Lusíadas. Essa metáfora remete à prática
interdisciplinar: nós, professores de História e de Literatura da série, buscávamos
práticas e fundamentos que, por meio de novas táticas e estratégias, produzissem
uma nova cultura dos saberes pedagógicos, saberes esses integrados por
professores e alunos na viva dialética do cotidiano da sala de aula e na concretude
do currículo escolar.
Cabe apontar que a maneira de fazer e o proposto nos
objetivos do projeto permitiu uma inversão das perspectivas, um deslocamento ao
aprender a aprender, a terceira margem, desafio que aceito e alcançado se
traduziu em habilidades e competências, requisitos tão caros à cidadania. As
porosas fronteiras entre a História e a Literatura foram atravessadas com os
conteúdos curriculares das diferentes disciplinas, mas com uma produção de
sentidos que desencadeou sentimentos e afetos que se expressavam nas
apresentações no palco do Salão Brasil, ansiosamente preparadas pelos alunos e
aguardadas pela comunidade escolar.
O projeto Tertúlia Romântica se constituiu cultura escolar
pelo significado atribuído a essa prática pelos que nela se envolveram,
conforme se depreende dos depoimentos postados no blog memoriatertuliana.cmpa.blogspot e de tantas outras manifestações de
diferentes fontes e suportes de que tenho registro.
Como docente de uma escola tradicional, vinculada a uma Instituição
que tem nos seus fundamentos a meritocracia, procuramos espaços mais
colaborativos e cooperativos para a construção de novos conhecimentos e de inclusão
de todos os alunos nas suas múltiplas realidades. Nessa construção, o aluno
pode se ver refletido tanto na assimilação de novos conhecimentos como na
produção das performances e das paisagens de representações que compõem o
repertório de dez anos de Tertúlia. A atividade artístico-cultural, uma das
etapas do projeto, traduzia-se como culminância dos estudos da História e da
Literatura do Séc.XIX, uma transposição dos conhecimentos e expressão de
verossimilhança numa interpretação com as marcas das sensibilidades dos
atores/alunos.
As habilidades e competências desenvolvidas com essa prática,
nas suas diferentes linguagens, ajudaram os jovens a perderem a timidez e a
desenvolverem a autoconfiança, a integrarem atividades em grupo, a se
interessarem mais por textos e autores, a desenvolverem a capacidade de
produção textual e a iniciação à pesquisa, a trabalharem a percepção dos
direitos da cidadania, estimulando a imaginação e a organização do pensamento
por vias não tradicionais. Assim, entender e estimular o trabalho
artístico-cultural torna a escola em um espaço vivo, produtor de novos
conhecimentos e propício a revelações inéditas de capacidades, o que aponta
para uma transformação pessoal, a de conceber e olhar o mundo e a si mesmo de
modos diferentes.
Como professora e coordenadora do projeto, considero que
aquele fazer pedagógico do processo educacional deve acompanhar os que neles se
envolveram até hoje, o que, de fato, se constata no blog pelos seus depoimentos
postados. Considero que aquela
atividade, agora apurada em um retrospecto, teve forte relevância na vida de
inúmeras pessoas. Sinto–me honrada por essa trajetória e por ter tido como
pares colegas/professores e alunos comprometidos na busca de novos
conhecimentos.
Atualmente, já aposentada, sou pesquisadora da cultura
afro-brasileira. Aproveito o ensejo deste espaço para cumprimentar a professora
Marta por sua pesquisa de resgate do trabalho sobre essa prática
interdisciplinar da Tertúlia e da memória coletiva de alunos.
Enviado por araujo49 em 07/05/2011
A Tertúlia do ano de 2008 teve como foco os Cem Anos de
Machado de Assis. Apresento uma amostra do evento artístico, o ato nº1: o
Encontro entre o menino e o bruxo, uma adaptação do livro O Menino e o Bruxo de
Moacir Scliar. No palco do Salão Brasil ambientado em uma sala do sobrado do
Cosme Velho, decorada com os títulos da obra machadiana, ocorre o encontro.
Foram atores o aluno Peres como Machado (adulto), a aluna Renata Schindel, como
o menino e narrador o aluno Leffa, todos da turma 202.
Na ocasião, solicitei à aluna Renata Schindel que escrevesse
sobre a experiência de adaptar um texto, cabe aqui reproduzir o seu registro.
Enviado por araujo49 em 07/05/2011
X Tertúlia na íntegra, veja o link: http://www.youtube.com/watch?v=cck3_txaWrw
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